Monday, May 12, 2008

Europa e América Latina atacam fome e aquecimento
Mais de 40 chefes de Estado se reúnem na capital peruana para acertar mecanismos de apoio a desenvolvimento com face social e ambiental
Silvio Queiroz

Pelo menos 47 chefes de Estado e governo haviam confirmado presença, até a última sexta-feira, na quinta reunião de cúpula entre a União Européia e os países da América Latina e Caribe, que se realizará em Lima entre a próxima terça-feira e o sábado. Combate à pobreza e desenvolvimento sustentável, que contemple inclusão social, segurança energética e preservação do meio ambiente, são os temas oficiais da agenda. Na ante-sala do encontro, porém, as duas regiões deixam entrever diferenças significativas de abordagem para preocupações consensuais, e expectativas de maior compromisso da contraparte, especialmente nas relações comerciais e no delicado tema da imigração.

“São temas do maior interesse do Brasil, e nos quais temos muita autoridade para nos dirigirmos à UE, já que somos pioneiros tanto nas iniciativas de combate à fome quanto no desenvolvimento de energias limpas”, disse um diplomata brasileiro envolvido diretamente na preparação da cúpula. O governo Lula tem a expectativa de aprimorar “a coordenação de posições” entre as duas regiões sobre ambos os assuntos, e vai cobrar dos europeus mais ênfase na transferência de tecnologia para ações capazes de contemplar tanto as preocupações sociais quanto as ambientais. Nesse terreno, o país oferecerá propostas de cooperação triangular em benefício dos países mais pobres da região, especialmente o Haiti, atingido em cheio pela alta dos preços dos alimentos. Em troca, espera da Europa que aporte mecanismos financeiros.

Um dos focos potenciais de dificuldades, desde o esboço da declaração conjunta que os chefes de Estado e governo assinarão na sexta-feira, está o endurecimento da legislação sobre imigração em vários países europeus. O texto deverá conter uma referência à “observância dos direitos humanos dos imigrantes”, mesmo os que apresentam situação irregular. “A gente pensa em um tratamento mais digno para os latino-americanos na Europa”, disse essa fonte do Itamaraty. “No Brasil, nenhum estrangeiro irregular é considerado criminoso, e não compreendemos que alguém vá para a prisão por não apresentar documentação suficiente.” Pelo lado europeu, em uma videoconferência com a imprensa latino-americana, durante a semana passada, a comissária européia para Relações Exteriores, Benita Ferrero-Waldner, enfatizou que a UE quer “compartilhar responsabilidades” com a América Latina no combate à imigração ilegal, ao tráfico de pessoas e outros crimes associados.

Comércio
À margem da cúpula, serão realizadas em Lima reuniões entre a UE e o Mercosul — tanto em nível de chanceleres quanto de presidentes e premiês — para explorar caminhos que permitam avançar para um acordo birregional de livre comércio. Na videoconferência de imprensa, o comissário de Comércio, Peter Mandelson, reafirmou que o bloco europeu atrela esse processo à conclusão da Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio, travada pela disputa entre países ricos e em desenvolvimento sobre subsídios agrícolas. “O Mercosul está pronto para negociar, e a UE tem sinalizado informalmente a disposição de seguir em frente a despeito do andamento de Doha”, disse o diplomata brasileiro.
Parceria assimétrica

160 bilhões
de euros é o montante anual do comércio entre a UE e os países da América Latina e Caribe, que exportam comodities e importam bens industrializados

5%
é a participação latino-americana nas importações européias, enquanto a Europa representa 14% do mercado externo para a América Latina

400 bilhões
de euros é o estoque de investimentos da UE na região, o que representa 12% do total de investimentos externos diretos do bloco


Diário de Natal Cisne Branco chega para visitações

Na manhã de hoje o navio-veleiro Cisne Branco atraca novamente em Natal. O navio da Marinha do Brasil ficará aberto a visitação pública de amanhã até quarta-feira, entre às 14h e 18h, no Porto de Natal. A tripulação é composta por 11 oficiais e 49 praças, com o atual Comandante sendo o Capitão-de-Mar-e—Guerra Flávio Soares Ferreira.

O Cisne Branco representa o país em grandes eventos náuticos, tanto no Brasil quanto no exterior, e é similar a uma réplica das galeras do século XIX. Além disso, o navio também tem o intuito de fomentar a mentalidade marítima, as tradições navais e contribuir para a formação dos oficiais da Marinha do Brasil.

O navio foi construído em Amsterdã, na Holanda, no ano de 1998 e incorporado à Marinha do Brasil em março de 2000. Sua primeira viagem pela Marinha teve início às margens do Rio Tejo, em Portugal, no dia 09 de março, exatamente 500 anos após a partida de Pedro Álvares Cabral para o descobrimento do Brasil.

O projeto do Cisne Branco inspira-se nos desenhos dos últimos “Clippers” construídos no final do século XIX. A construção do navio ocorreu em tempo recorde, um ano e três meses, com o principal propósito de permitir ao Brasil participar com um navio de propulsão à vela, da histórica travessia em comemoração aos 500 anos de descobrimento do país, em 22 de abril de 2000.

O nome do navio é decorrente de um verso da música Cisne Branco, canção símbolo da Marinha do Brasil, também chamada Canção do Marinheiro. Este é o terceiro navio da Marinha do Brasil a ser batizado com esse nome.

Veleiro-escola

O veleiro Concórdia atracou no Porto de Natal às 9h de ontem, trazendo estudantes americanos e canadenses. Com bandeira de Barbados, o veleiro viaja ao redor do mundo levando estudantes em um programa de 10 meses, que além de apender sobre técnicas de marinhagem, conhecem um pouco da realidade dos países que visitam.

O navio vem da ilha de Santa Helena, no Reino Unido, e parte para Belém do Pará na próxima quarta-feira. Estão a bordo 39 estudantes, cinco professores e dez tripulantes. Um dos estudantes é John Ogle, natural da cidade de Calgary, no Canadá, que contou estar viajando desde o dia 1º de setembro de 2007 e já passou por cidades da América, Europa e África.

Para o estudante, de 19 anos de idade, o programa mudou totalmente sua visão de mundo e quando voltar para a Universidade, ele pretende cursar economia ou comércio exterior. ‘‘Gostei muito da África e depois de ter estado lá passei a ter vontade de ajudar organizações de cidades que conheci’’, afirma John.

A cada dois anos, o navio Concórdia visita os continentes Africano, Europeu e Americano, sempre fazendo parte do programa educacional.


Jornal do Brasil O que se passa nesta cabeça...
Em entrevista exclusiva, Beltrame avisa que não vai conseguir acabar com violência
André Balocco

O cenário, na chegada, é um tanto quanto sombrio. Em meio à desordem urbana que salta aos olhos misturando camelôs, prostitutas, menores infratores e policiais, a Central do Brasil surge imponente. Lá dentro está um dos homens mais poderosos do Estado: José Mariano Beltrame. Como todo bom gaúcho, este sulista, nascido em Santa Maria, não dispensa o chimarrão: basta uma rápida passada de olhos por sua mesa de madeira de lei que lá estão a cuia, a bomba e a erva, escondidos sob a bolsa verde com os dizeres ‘Chimarrão, símbolo de solidariedade’.
– Adoro a erva – diz, sem esconder o característico sotaque carregado de quem nasceu no Rio Grande.
Um pouco mais à esquerda, no impecável gabinete, está a miniatura de um caveirão, blindado muito utilizado pela Polícia Militar para penetrar nas favelas dominadas pelo poder paralelo. Foi neste cenário que o Jornal do Brasil entrevistou, com exclusividade, aquele que é um dos mais importantes pilares da política do governo Cabral.
Vencendo a desconfiança
De um início nervoso por conta da expectativa de mais um bombardeio de críticas, a conversa passou a fluir com naturalidade. Talvez a primeira pergunta tenha sido determinante para que a cordialidade se estabelecesse:
– Antes de tudo, secretário, gostaria de saber se o senhor é candidato a algum cargo na próxima eleição – perguntei.
A resposta veio rápida como os estragos que a polícia vem fazendo no crime organizado, segundo os números apresentados pelo Instituto de Segurança Pública.
– De maneira alguma. Não tenho qualquer pretensão política – avisou.
Daí para a frente o tempo passou mais rápido do que se imaginava. Em pouco mais de 70 minutos de conversa, interrompida apenas uma vez para que passasse ao governador Sérgio Cabral detalhes da operação policial no Leme, que terminou com dois presos na quarta-feira, o homem que apostou na política de confronto com o tráfico se abriu. O orgulho pelo aumento de apreensão de armas pesadas e drogas, desde que assumiu a secretaria, em janeiro do ano passado, está estampado no rosto do policial federal formado na turma de 1981 que, revela, sente saudade do front.
– Era muito bom ir para o combate – conta.
Na conversa, foram vários os assuntos. Descriminalização das drogas, uso de tecnologia militar pelo tráfico para reconstruir armamentos, a importância da inteligência no combate ao crime, a oportunidade histórica que o Estado tem para começar a recuperar o déficit social através do PAC nas favelas, o reconhecimento de que os policiais militares do Rio recebem um salário parco... Mas as revelações não param por aqui. Beltrame conta ainda que vai receber 500 fuzis FAL da Marinha brasileira, que 300 câmeras inteligentes, herança dos Jogos Pan-Americanos, estão encaixotadas em algum ponto da cidade por conta da burocracia, faz críticas à constante troca de secretários nacionais de segurança em Brasília e revela, com incrível segurança: a violência não vai acabar na sua administração.
– A polícia, hoje, enxuga gelo. Temos de estar sempre fazendo um trabalho de contenção para evitar a expansão da criminalidade. Por isso as obras do PAC são tão importantes para complementar este trabalho.
Então, vamos ao que interessa. A seguir, na página ao lado, a entrevista na íntegra que revela o que pensa José Mariano Beltrame, ou simplesmente Beltrame, sobre os problemas que afligem a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Um Rio que ele adotou como seu e aprendeu a amar.

Fala, Beltrame
Novos fuzis
A Marinha está nos cedendo 500 fuzis em lotes intercalados. A PM e a Polícia Civil necessitam deste armamento. Recebemos fuzis FAL 762 revisados, com mil carregadores e 100 vão para a Polícia Civil. Temos bons fuzis apreendidos, como o AK-47 (arma russa), mas há dificuldade para adquirir munição. É uma arma boa, leve, que mais se adapta aqui, mas tem a burocracia.
Armas com civis
A posse deve ser para quem tem necessidade de utilizá-la e isso recai no uso militar. Portanto, para o cidadão, não é bom ter uma.
Tráfico e Exército
O que posso dizer é que determinados equipamentos e explosivos apreendidos, além de armas, têm sido feitos por pessoas com conhecimento em manutenção e recuperação de armamento. E esta técnica não está disponível no mercado. Isso nos concorre a achar que há participação no tráfico. No Pavãozinho, semana passada, apreendemos explosivos que poderiam ser detonados à distância, por controle remoto. Isso não é coisa de amador, não se aprende na esquina.
Menores no crime
É uma situação que nos preocupa, o menor que não tem perspectiva. Ele não tem colégio em tempo integral, uma boa orientação e o que circunda a área onde mora, muitas vezes, não é positivo. Há ainda a família desagregada... Então ele acaba sendo uma presa fácil para o tráfico. Se ele ficar numa laje recebendo R$ 20, no fim do mês vai ganhar mais do que o pai ou a mãe. Esta falta de perspectiva é um problema crucial.
Violência sem fim
Acho que sem dúvida nenhuma a polícia acaba fazendo um trabalho de ‘enxugar gelo’. Ela transparece esta sensação, mas é preciso entender que hoje estamos procurando evitar que isto se alastre. Se pararmos de ‘enxugar gelo’, isto vai crescer muito. Tenho convicção de que a violência não vai terminar na minha gestão nem na do próximo secretário. É um processo de recuperação de cultura, de geração de emprego, de renda.

PAC contra o crime
Acho que o Rio tem historicamente uma grande possibilidade, que é o PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) e o Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania). Podem dizer ‘não, são planos audaciosos, não vai dar certo‘, mas o caminho é este porque recuperam a cidadania. Isto é para, no mínimo, 10 anos. Não há solução a curto prazo.
Política de segurança
Temos informações de que o tráfico hoje passa por dificuldade financeira e de articulação. Os soldados do tráfico já estão pensando duas vezes antes de se exporem guardando um paiol ou fazendo a segurança da droga. Antes, o fuzil era uma arma difícil de aparecer como apreendida. A metralhadora .30, por exemplo: em seis meses pegamos 12, enquanto nos últimos quatro anos foram só duas, se não me engano.
O uso da Inteligência
Não vamos entrar nas favelas sem objetivo, tipo pegar 100 policiais e entrar lá, porque pode acontecer o banho de sangue. Então, depois das ações de inteligência, vamos em busca das pessoas já sabendo onde elas estão e o que têm. Isto aconteceu no Leme. Muitos perguntam: porque o senhor não faz uma operação em tal lugar? Eu digo: não faço nada sem informação concreta porque ela permite que eu planeje, que diminuia a possibilidade de um fato ruim acontecer. O trabalho de inteligência estava desarticulado quando chegamos e hoje estamos muito afinados. A PF nos dá um apoio bom também. Posso dizer que a integração entre as polícias começa com a inteligência.
Inércia do Estado
Este problema da violência, hoje, está complexo porque existia uma inércia do Estado por 30 anos. Por isto o tráfico adquiriu esta gordura criminosa, por inépcia e inércia do Estado. Chegamos numa encruzilhada. Temos de decidir isto.
Liberação das drogas
No campo das idéias não vejo problema algum nas pessoas discutirem isto. Agora, para mim, isto é crime e como tal tenho como obrigação de atuar. Acho que temos de fazer a seguinte reflexão: qualquer atividade econômica humana tem fases, isto é estatística. Para comer arroz nós temos a plantação, a distribuição...A droga é a mesma coisa. Eu te pergunto o seguinte: se eu tirar o consumidor desta cadeia, estou mexendo neste mercado, contribuindo para terminar? Isso é lógico. Sou contra a descriminalização.
Marcha da Maconha
Acho que como manifestação, sim, mas tem de saber discernir entre apologia e manifestação. Liberar sem saber como vai ser a manifestação...Apologia não dá para se liberar. Agora discutir, isto é outra coisa. É temerária a caminhada porque em Recife, onde foi liberado, por exemplo, apareceu gente até fumando. Então, por prevenção, é melhor que não se faça.
Dependência química
Se o Estado quiser descriminalizar a droga, tem de preparar seu sistema de saúde para recuperar o drogado, porque ele mesmo diz que o drogado é um doente. Vamos descriminalizar a droga? Vamos, mas e depois? Não podemos nos iludir: a mesma pessoa que clama por segurança nas ruas pode ser a mesma que vai para dentro da delegacia ou que faz passeata pela descriminalização. Temos menores que cheiram cola, que fumam maconha porque não aguentam mais ver os pais batendo nas mães, o pai estuprar a irmãzinha, não aguentam mais apanhar. Têm pessoas que cheiram cola e fumam maconha porque têm de dormir ali perto da Rodoviária, debaixo do viaduto, assim como há pessoas que vão fumar maconha numa situação muito mais privilegiada social e economicamente do que eles. Quem vai levar a pior? Entre uma pessoa de classe alta que fuma maconha e uma pessoa dessa, quem está sujeito a virar um trapo humano? Falam da descriminalização da droga mas eu quero ver alguém acender um cigarro de maconha diante do centro financeiro de Amsterdam. Quem fuma maconha lá é discriminado. Tem muita água para passar debaixo desta ponte para se chegar a um entendimento, mas acho que uma reflexão no campo das idéias prolifera a discussão. Porém, hoje, no mínimo, é temerário descriminalizar a droga em função deste disparate que temos na sociedade brasileira.
Perícia técnica
Estamos indo muito bem neste caminho. Os pilares na transição eram polícia científica, inteligência, gestão e corregedoria. Com relação à polícia técnica estamos muito bem. Dentro de dois meses teremos um Instituto Médico Legal (IML) novo, com equipamentos importados. E estamos reestruturando o Instituto Carlos Éboli em termos de equipamentos e vidraria. Estou licitando e comprando um equipamento novo e promovendo a visita dos nossos peritos que trabalham no IML e no ICCE aos respectivos institutos em São Paulo. Gastamos em torno de R$ 3 milhões no IML. Já no ICCE o valor é bem menor. São coisas mais leves e por isso com um custo bem mais barato para nós.
Máfia no IML
Conheço o senhor Daniel Ponte (vice-diretor do IML do Rio que denunciou no Congresso a existência de uma máfia no instituto). Já o atendi e o recomendei que procurasse o serviço de proteção à testemunha. Uma coisa é saber sobre fatos e outra é ter provas. Eu não posso trabalhar com "me disseram, me extorquiram". A minha visão aqui não é mais prender. Precisamos fazer provas porque é a Justiça que extirpará estas pessoas.
Novo IML
O IML vai funcionar 24 horas com controle de entrada e saída de pessoas, material e cadáveres. Vai ser um controle eletrônico e muito bem feito. E teremos ainda câmeras filmando o movimento.
Legado do Pan
O material de inteligência está funcionando a 100%. São softwares de cruzamento de dados e informações, um banco de dados de inquérito e processos judiciais. As grande operações que se vê por aí vêm desta inteligência. Planejamos antes do Pan que este equipamento viesse de acordo com a nossa necessidade para depois dos Jogos. Temos uma sala de centro de crise onde herdamos todo o equipamento para ainda montar no terceiro andar.
Burocracia
Ganhar, nós ganhamos os equipamentos, o problema é que ficou uma comissão para fazer a passagem, mas mudou o secretário Nacional de Segurança e mudou a comissão. Já estamos no terceiro desde que assumi! Agora é que nós começamos a nos reunir. Dia 14 teremos a segunda reunião. Temos um número substancial de câmeras para espalhar pela cidade e ligar com os batalhões de suas respectivas áreas. São em torno de 300 que vão se espalhar. Mas não sei ainda quando teremos elas funcionando, pois aí vem o serviço público. Vou recebê-las e depois licitar a instalação delas. Aí vem uma empresa que se sente prejudicada, entra na Justiça, consegue uma liminar. É complicado.
Salários da PM
O policial militar ganha pouco, muito pouco. O governo vai acenar com um aumento mas enquanto isto não acontece, estamos dando salário indireto. O RioCard, a construção dos ambulatórios para a PM na Zona Oeste, a bolsa Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania, ação conjunta para capacitar a força policial). Com ela o policial pode se habilitar num curso pela internet e auferir mais R$ 400 mensais. E a Faetec vai fazer cursos de computação nos batalhões.
Corrupção
A corrupção existe e é inegável, mas estamos trabalhando incessantemente no sentido de provar. Temos uma gama grande de denúncias, mas a denúncia é aquela: "fulano me pediu x, me pediu y". Isso só serve para acenar de que a gente vá em cima. Para você ter uma idéia já ultrapassamos aqui, só em 2007, o número de 200 policiais excluídos da PM sumariamente. Agora, o que a gente precisa é de prova.
Milícias
Eu sei onde tem a milícia, mas não adianta ir lá e encontrar um policial armado a paisana. Ele está lá, e daí? Está na folga, está lá, a mãe mora ali, a namorada, um parente. Não posso bater na porta da comunidade e perguntar: ’você paga 10 reais para este pessoa?‘ Se tivesse isto no papel, tudo bem. Então é ônus nosso produzir as provas e agir como fizemos para desarticular aquela milícia (do vereador Jerominho e do deputado estadual Natalino Guimarães), que eu entendo como a mais bem estruturada. É complicado, mas lutamos muito para construir provas com qualidade. E o que tem qualidade demanda tempo.


O Estado de São Paulo Rios amazônicos: naufrágios e uma infinidade de armadilhas flutuantes
Barcos superlotados contribuem para tragédias como a do Comandante Salles, que matou mais de 50 pessoas
José Maria Tomazela

Tragédias como o naufrágio do Comandante Salles 2008, que deixou há uma semana mais de 50 mortos - 46 corpos haviam sido resgatados e pelo menos 10 continuavam desaparecidos até anteontem -, podem voltar a acontecer. Parte da frota que transporta de 30 milhões a 50 milhões de passageiros por ano é composta por verdadeiras armadilhas flutuantes.

São barcos de madeira malconservados e sem equipamentos básicos de navegação, como rádio, que levam cargas e pessoas em excesso. Calcula-se que pelo menos 5 mil sejam piratas, sem registro nas capitanias fluviais da Marinha. Construídos de forma artesanal, muitos não têm estrutura para enfrentar turbulências dos rios e clima amazônicos, sujeitos a tempestades tropicais e mudanças repentinas de vazão. “São como caixas de fósforo numa enxurrada”, resume o comandante do Pelotão de Policiamento Fluvial da Polícia Militar, subtenente Fonseca Paes. É o caso do Comandante Salles, posto para navegar sem ter passado por inspeção. O Estado percorreu, entre quinta e sexta-feira, mais de 100 quilômetros dos Rios Solimões, Negro e Amazonas, a maior parte em barcos dos bombeiros e da PM de Manaus.

Já na partida, no porto da Manaus Moderna, irregularidades eram flagrantes. O navio Ana Maria V estava com tanto peso que a linha d’água ultrapassava o limite de segurança para navegação. Era um barco alto, de madeira, pronto para seguir viagem de sete horas até Orimixá. Empilhada, a carga de bebidas, sacaria e caixas de papelão tomava todo o porão e o convés inferior. Passageiros viajariam na parte superior. “Com uma carga dessas, há risco potencial de tombamento”, disse o subtenente. A carga estava desamarrada e só foi presa na presença do policial. “Veja só, foram comprar o rolo de corda agora.” O conferente Manoel Pinto de Azevedo garantiu que estava “tudo dentro do limite”. Ele mostrou a relação de passageiros que seria entregue à Capitania Fluvial da Marinha. Apesar do fluxo intenso de cargas e passageiros lotando dezenas de barcos, não havia ninguém para conferir planilhas. Em outro barco, a aposentada Maria José Machado, de 56 anos, ajeitava-se nas redes com seis netos pequenos para encarar 15 horas até Urucará. Ela tinha feito a viagem duas vezes e a achava segura, mas ficou assustada com o naufrágio. “A gente entrega na mão de Deus.”

O dono Tito Nogueira de Souza mostrou bóias e coletes salva-vidas “até de sobra”. O problema é a lona plástica que protege as laterais do barco e, em caso de naufrágio, funciona como parede intransponível a quem tenta se salvar. “É para proteger do vento e da chuva”, afirmou.

Outro problema: portas dos camarotes abrem para fora e, em caso de naufrágio, passageiros não conseguem abri-las pela pressão da água. Segundo o comandante, muitos barcos saem com lotação completa do porto, mas param no caminho para pegar mais passageiros. “O pessoal acena do barranco e o barco ou encosta ou reduz a velocidade para ser alcançado pela rabeta (pequena embarcação a motor).” Ele apontou dezenas de pontos de parada entre Manaus e Manacapuru.

No Rio Solimões, outro flagrante de abuso: o barco Suely Gomes transportava pessoas no convés superior. “É totalmente proibido. Um balanço mais forte joga as pessoas para fora e ali não tem bóias e coletes.” Outro barco menor, o Silas, passou com 12 a bordo, todos sem salva-vidas. Uma rabeta com duas crianças era conduzida por um garoto de, no máximo, 15 anos. Havia lanchas da Marinha patrulhando a região, mas os barcos usam furos e paranás, braços de rio, como rotas alternativas para escapar da vigilância. Num deles, o movimento intenso de embarcações incomoda as 50 famílias da Vila Nova, município de Iranduba. O pescador Manoel Veríssimo Rodrigues, de 53 anos, conta que o “banzeiro” - ondas provocadas pelos barcos - balança e estraga o telhado da casa flutuante que divide com a mulher Isabel, seis filhos e uma netinha. “Das 3 às 5 da manhã é muito barco e a casa não pára de balançar.” O movimento se repete das 15 às 22 horas, engrossado pelas balsas boiadeiras que retiram gado das margens alagadas do rio para levar à terra firme. “Os barcos que trazem as crianças da escola quase viram.” Segundo o subtenente, embarcações maiores são obrigadas a reduzir a marcha ao passar em áreas de tráfego de barcos menores, como vilas de pesca. “Ninguém obedece.”

Na noite de quinta-feira, a lancha dos bombeiros cruzou com barcos que trafegavam sem iluminação. Piloto experiente, Paes conta que o Solimões é perigoso: águas avançam sobre as margens e arrancam, além de porções de terra que a tornam barrentas, troncos e capim. Nas partes mais profundas, que chegam a 60 metros, são comuns redemoinhos como o que teria contribuído para o naufrágio do Comandante Salles 2008. Ventos repentinos e tempestades ajudam a desestabilizar as embarcações. A lancha da PM foi uma das vítimas: a manobra rápida do subtenente não conseguiu evitar um tronco que partiu a ponta da hélice, próximo do encontro com as águas do Rio Negro. O tenente Andrey Barbosa Costa, mergulhador dos bombeiros, que participou das buscas dos náufragos, disse que o Solimões é perigoso até para bons nadadores. “Não se vê nada e a corrente pode arrastar para fora do ponto de busca.”

A presidente da Associação dos Armadores do Transporte de Cargas e Passageiros (Atrac), Alessandra Martins, disse que o naufrágio foi uma tragédia anunciada. Segundo ela, há tempos a entidade denuncia as precárias condições do setor por falta de legislação e investimentos públicos. A Atrac anunciou uma greve para a próxima quarta-feira em razão de falta de segurança e do alto custo de combustível. “Nenhum barco vai sair de Manaus”, prometeu.


O Estado de São Paulo Em três anos, mais de 150 mortos em acidentes na região
Dono do barco costuma viajar com a tripulação: “Se reclama do excesso de passageiro, perde o serviço”
José Maria Tomazela

Em pouco mais de três anos, desde 2005, foram registrados 133 acidentes nos rios da Amazônia Ocidental, com um número de mortes superior a 150, incluído o naufrágio do Comandante Salles 2008, no domingo passado. Foram 158 abalroamentos - colisões laterais entre barcos grandes e menores -, 21 colisões frontais e 59 naufrágios. Mortes em naufrágios podem chegar a 130, se somados os desaparecidos no Solimões.

Essa região da Amazônia compreende Amazonas, Roraima, Rondônia e Acre. Este ano já registra o recorde de 83 mortes, segundo números da Capitania Fluvial de Manaus. Em janeiro, o barco Almirante Monteiro afundou, após colidir com uma barcaça petrolífera, matando 16 pessoas. Em 2007, morreram 18 pessoas, 12 em naufrágios; em 2006, foram 17, 9 em naufrágios, e em 2005, 35 mortes.

O naufrágio do Comandante Salles, com 46 mortes confirmadas e 10 pessoas desaparecidas, pode superar o número de vítimas fatais desde 1999, quando o Ana Maria VIII naufragou, matando 52.

O capitão Paulo Brito da Silva, da Capitania, lembra que a malha fluvial de 22 mil quilômetros são as rodovias da Amazônia, usadas por 35 mil embarcações - 40 mil se consideradas as clandestinas. “A dificuldade é a mesma de controlar a frota de veículos em outras regiões, como no Sudeste”, comparou.

A Capitania dispõe de 550 homens para fiscalizar os rios, o que dá uma área de quase 10 mil km² por militar. Para Silva, o problema não está na falta de pessoal ou equipamentos, mas em aspectos culturais. “O passageiro e alguns donos de barcos, gente que convive com o rio desde o berço, não se dão conta dos riscos.” Ele disse que o piloto é obrigado, sob pena de multa e cassação do registro, a respeitar limites de carga e passageiros. O dono do barco fica sujeito a multa de R$ 40 a R$ 3,2 mil. “Não tem como fiscalizar todos os barcos.” Muitas embarcações carregam e partem sem utilizar as balsas de embarque e desembarque da Capitania para escapar de taxas e fiscalização. “Aqui, cada barranco vira um porto”, diz.

Sobre as condições dos barcos, o capitão lembra que os projetos de construção precisam ser assinados por um engenheiro naval e acompanhados pela Capitania. “Normalmente, o processo é inverso: fazem o barco e querem que seja aprovado.” Como o serviço de transporte fluvial não é regulamentado, as empresas têm pouco interesse em investir no setor.

Silva conta que geralmente o dono do barco viaja com a tripulação, o que tira a autonomia do comandante. “Se reclama do excesso de passageiro, perde o serviço.” A Capitania iniciou programa de segurança com distribuição de livretos e campanha em rádio e televisão. Também criou um telefone para receber denúncias.

O inquérito que apura as causas do naufrágio do Comandante Salles 2008 não foi concluído. Silva diz que entre as causas podem estar excesso de carga, tripulação não habilitada e condições da embarcação, sem registro.


O Globo UMA EXPANSÃO SILENCIOSA PELO CONTINENTE
Acossada em seu país, guerrilha colombiana monta rede de organizações de apoio no resto da América

BOGOTÁ. Bernardo é um economista argentino, de não mais que 50 anos, e, entre 1990 e 1996, foi assessor externo da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal). Depois de fazer uma pequena fortuna, acaba de enviar seu filho mais velho aos Estados Unidos para fazer um curso de piloto.

Já o colombiano Héctor Orlando Martínez Quinto chegou em 2000 à Costa Rica e se casou com uma jovem, o que lhe permitiu obter o visto de residência e ingressar no mundo das frotas pesqueiras, em associação com outro colombiano, Huberth González Rivas, também casado com uma costa-riquenha.

Essas poderiam ser histórias ordinárias de emigrantes latino-americanos, a não ser pelo fato de Bernardo e Héctor Orlando serem dois dos agentes usados pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) para levar adiante uma nova e silenciosa batalha: expandir-se ideológica, logística e financeiramente pela América Latina.

Membros das Farc se passam por refugiados

Bernardo, dizem fontes do Exército colombiano e das próprias Farc que hoje colaboram com a Justiça, foi o encarregado de penetrar em países do Cone Sul, enquanto Héctor Orlando - autor do massacre de Bojayá (Chocó), em maio de 2002 - se meteu no negócio da pesca na Costa Rica para utilizá-lo como base de troca de cocaína por armas. É a conclusão a que chegou o Ministério de Segurança da Costa Rica.

- A estratégia consiste em enviar a esses países quadros com o disfarce de refugiados, que, uma vez instalados, tornam-se intocáveis e iniciam a ofensiva - assegura um oficial colombiano.

Na Argentina, foram recebidos nos últimos cinco anos 80 refugiados políticos colombianos. Mas quando se indaga sobre seu passado e suas atividades, a resposta oficial do governo é que, ainda que entre eles haja vários membros das Farc, trata-se unicamente de perseguidos ou desmobilizados.

O mesmo padrão se repetiria no Equador, no México e no Brasil. Essa estratégia internacional da guerrilha começou a se gestar em 2002, quando Alvaro Uribe chegou ao poder na Colômbia, com um duro discurso contra as Farc e com as Forças Armadas fortalecidas.

- Por causa da pressão militar, as Farc se viram obrigadas a renunciar à campanha de seqüestros e às grandes ações, com que chegaram a penetrar inclusive em Cali, a terceira cidade mais importante da Colômbia - diz um membro da inteligência militar colombiana.

Naquela época, o Secretariado das Farc optou por iniciar a penetração no resto do continente, que já tivera duas fases, embora pouco produtivas. A primeira, nos anos 80, fracassou por inexperiência. E a segunda foi detida pelo retrocesso do socialismo a nível mundial.

Mas essa terceira fase, coordenada pelos membros do Secretariado Raúl Reyes e Iván Márquez, rendeu frutos. As Farc conseguiram armar uma rede de mais de 400 organizações legais, clandestinas e semiclandestinas que respaldam sua causa, da Argentina até os EUA. Sua ponta de lança foi a Coordenadora Continental Bolivariana (CCB). Não é gratuito que, três dias antes da morte de Reyes, o Segundo Congresso da CCB, reunido em Quito (Equador), tenha aprovado uma resolução de apoio à batalha internacional das Farc para serem tiradas da lista de organizações terroristas e reconhecidas como grupo beligerante.

Na rede de organizações articulada pelas Farc há desde movimentos de revolucionários puros até ONGs defensoras dos direitos humanos, passando por partidos políticos legalmente estabelecidos. A inclusão na categoria de legal ou ilegal decorre do tipo de atividades que desempenham. Se o apoio é apenas ideológico, não há laços. Mas se passa a ser, transformam-se imediatamente em alvo das autoridades. E isso é o que começou a ocorrer com muitas organizações em toda a América Latina. Por exemplo, o Movimento Revolucionário Tupac Amaru (MRTA), no Peru, dá respaldo aberto ao discurso das Farc, por ter como coincidência ideológica um acirrado antiimperialismo. Mas, desde 2006, também há indícios de que membros do grupo peruano tenham recebido treinamento militar da guerrilha. A polícia local tem evidências de que as Farc usam a cidade de Iquitos para recrutamento de milicianos e recuperação de feridos, obtenção de armas e tráfico de drogas.

Próximo objetivo é penetrar nos Estados Unidos

Esse limite entre o apoio ideológico e logístico (incluindo-se o tráfico de drogas e armas) e a condição de refugiados por parte daqueles que promovem essas organizações é o que preocupa as autoridades da Colômbia e de outros países da região. Na Cidade do México, por exemplo, chama a atenção que alguns membros das redes bolivarianas têm interesses numa casa de câmbio e em duas empresas.

E no Equador há agentes de ligação, além de o país abrigar acampamentos da guerrilha. Também na Venezuela e na Colômbia, grupos de jovens aglutinados na Cruzada Latino-americana e no Grupo Anarquista foram treinados para manejar explosivos e armas. No Chile, a liderança do trabalho pró-Farc cabe a um refugiado conhecido como Roque, que conseguiu que o Partido Comunista enviasse membros à Colômbia para receberem instrução militar.

No entanto, tudo indica que o principal esforço das Farc esteja encaminhado a estabelecer algum tipo de conexão nos EUA. A inteligência colombiana assegura que as Farc já abriram ali duas bases de trabalho ideológico: uma ONG ambientalista e um centro de estudos. Com todo esse panorama, funcionários da inteligência do governo colombiano admitem que, embora as Farc estejam encurraladas na Colômbia, podem reclamar seu fortalecimento no exterior como seu grande triunfo nos últimos cinco anos.


O Globo UMA EXPANSÃO SILENCIOSA PELO CONTINENTE
Membros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc)

A maioria sob a condição de refugiados - estão formando desde 2002 núcleos ideológicos, logísticos e financeiros fortes em pelo menos sete países. O Peru serve como provedor de milicianos, armas e drogas; o Equador é um bastião financeiro e refúgio; já Venezuela, Costa Rica e México são locais de lavagem de dinheiro do narcotráfico e apoio ideológico; o Brasil entra na rota das drogas e do fornecimento de armas e a Argentina, como alvo de penetração; os Estados Unidos são o próximo objetivo.

O Grupo de Diários América (GDA), que reúne alguns dos principais jornais do continente e do qual o GLOBO faz parte, juntou esforços para traçar o mapa dessa expansão.

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